domingo, 17 de maio de 2009

Jornal de Notícias

David Mamet em palco portuense
00h30m
ISABEL PEIXOTO
David Mamet aponta o dedo ao Ensino Superior norte-americano, mas nem é nisso que reside o essencial de "Oleanna". A peça, que estreia esta terça-feira na sala Passos Manuel, no Porto, é uma subtil ironia sobre o poder do discurso. Para ver às 21.30 horas.
Quando a peça está mesmo a chegar ao fim, John faz o que qualquer espectador terá vontade de fazer mas não pode. Com a vida transformada num inferno, o injustiçado professor universitário reage violentamente sobre a estudante que o acusa. Para trás, hora e meia de um jogo verbal em que a verdade é legitimada pelo discurso e independente dos factos.
Será esta a principal mensagem que David Mamet transmite no texto, escrito em 1992 e aqui encenado por Carlos Pimenta, numa produção levada à cena pela companhia Ensemble, até dia 22, em que são intérpretes Jorge Pinto e Isabel Queirós. Apesar de a peça tocar em temas como o politicamente correcto, o assédio sexual e o fracasso do Ensino Superior, o essencial reside na "possibilidade ou impossibilidade de comunicação" e no "poder do discurso". Palavras do encenador, que resume muito bem numa frase o papel da aluna Carol: "Ela consegue, pelo discurso, convencer sobre um facto que não aconteceu".
Carol é uma rapariga com um grande défice de auto-estima que não conhece expressões como "nomenclatura" ou "suplício". Manipuladora, mas também manipulada sem disso dar conta, muda o discurso em função dos seus interesses e transforma-se numa pessoa odiosa.
Ao ascender da insídia não é estranho o jogo cénico. Não é por acaso que no ecrã - que reproduz pormenores do que se passa em palco - só um rosto aparece. Não é por acaso que o chão tem um desnível que coloca Carol num plano superior, como que a consagrá-la vitoriosa. E são nove os telefonemas que interrompem o diálogo. Também não é por acaso.

Jornal Público

O discurso é uma violência que fazemos uns aos outros
12.05.2009, Inês Nadais
Oleanna, de David Mamet, é a nova produção do Ensemble - Sociedade de Actores,
com encenação de Carlos Pimenta. A partir de hoje à noite no Passos Manuel, Porto

John (Jorge Pinto) e Carol (Isabel Queirós) equilibram-se a custo na plataforma giratória em que assenta a Oleanna de David Mamet nesta montagem de Carlos Pimenta para o Ensemble - Sociedade de Actores. Começam de pé, sim, mas acabam no chão, depois de uma daquelas guinadas de 180 graus em que deixam tudo, até a pele - e vamos ao chão com eles a partir desta noite no Passos Manuel, Porto.

É uma viagem em direcção ao Inferno, dentro deste carro de dois lugares, sem airbags e sem cintos de segurança, em que se transforma o gabinete de um professor universitário a partir do momento em que uma aluna entra por ali a fazer estragos. Podíamos ir por aí - pela agenda declarada desta peça em que Mamet discute "a maldição da educação moderna", "o preconceito de que todos temos de ir à universidade" e toda a perversão do politicamente correcto - mas este carro vai desgovernado e no fim, depois de se despistar, a agenda já passou a ser outra e, entre mortos e feridos, estamos à porta do tribunal, a discutir de quem é a culpa neste caso de violação.
Não que tenha havido uma violação - mas houve alguém a falar no assunto, e Oleanna é completamente sobre isso. "Aqui as coisas não precisam de acontecer para terem acontecido: além de legitimar os acontecimentos, o discurso também cria acontecimentos. O espectador viu tudo o que se passou e sabe que não houve uma violação. Mas mesmo assim admite, só porque ela fala nisso, que a violação possa ter acontecido", diz Carlos Pimenta.
Oleanna é o que acontece entre essa aluna e esse professor enquanto eles falam sozinhos naquele gabinete. "O que se passa ali é uma luta pelo discurso - e essa luta pelo discurso é uma luta pelo poder. O poder do professor é o domínio da linguagem. Mas ao longo desta viagem ele perde esse poder, deixa de ser ele a dar o nome às coisas. É um fenómeno muito do nosso tempo: não é por acaso que, no caso Maddie, foi comentado que a primeira coisa que o casal McCann teria feito teria sido ligar para a SkyNews. É nisso que esta peça ultrapassa a dimensão de uma pequena história entre um professor e uma aluna e se transforma numa tragédia sobre a incomunicabilidade", continua o encenador.
Embora Oleanna esteja completamente naquilo que é dito, a montagem do Ensemble induz o espectador a olhar para o que se passa ao lado do discurso. "O vídeo aqui não é ilustrativo - é quase como um bloco de notas com pequenos apontamentos, pequenas pistas, que criam uma narrativa paralela, à margem do visível", explica ainda Pimenta. Enquanto olha para ali - ou quando deixa de os ouvir, porque os silêncios e as interrupções são absolutamente centrais no texto -, o espectador tem tempo "para fazer um rewind e tomar uma decisão: 'ok, estamos aqui, e é isto que eu penso'".
Nesses momentos em que pára de falar, Jorge Pinto, fundador do Ensemble, já não sabe o que pensa: "Esta peça obriga-me a rever a minha própria posição, aquilo que eu considero honesto, correcto e que os alunos têm de respeitar. Mas as coisas que já não questionamos são precisamente aquelas que temos de questionar."

Oleanna

De David Mamet, pelo Ensemble - Sociedade de Actores. Encenação de Carlos Pimenta.
PORTO. Passos Manuel. De 2ª a sáb., às 21h30. Até dia 22.

Dizer é Poder

Dizer é Poder

“Os discursos devem ser tratados como práticas descontínuas, que se cruzam, que se justapõem por vezes, mas que também se ignoram ou se excluem. (…) Deve-se conceber o discurso como uma violência que fazemos às coisas, como uma prática que lhes impomos”
Michel Foucault in A Ordem do Discurso

Mais do que evocar, com bastante pertinência, questões relativas ao politicamente correcto, ao sistema educativo, ou ao assédio sexual, Oleanna é, essencialmente, uma peça sobre a comunicação, a linguagem e o poder subjacente à utilização do discurso. Em Oleanna temos duas verdades: a de John e a de Carol. Ambas assentam no desejo e no poder. Na oposição dos seus objectivos - que justifica o duelo que travam - encontramos personagens que, no uso da linguagem, procuram ganhar terreno, qual exército em conquista de territórios que ratifiquem a derrota do inimigo. Em Oleanna, os acontecimentos dizem-se e quem detém o discurso detém vantagem na legitimação dos factos. Esta questão, central em todo o processo de verificação da verdade no campo da comunicação, levou o semiólogo italiano Paolo Fabbri a formular uma interessante problematização “Se a objectividade é um problema que se estabelece no contexto da correspondência exacta entre o discurso e os factos, a pergunta que então se coloca é: o que quer dizer correspondência? Em seguida é necessário perguntar que factos, situações e pessoas, por um lado, e que palavras, por outro, fazem parte dessa correspondência. Neste sentido, o problema das palavras, das situações, é um problema de relações.”
Em Oleanna, ambas as personagens têm o seu discurso determinado pelos papéis que desempenham e que obedece a regras específicas de utilização: de um lado John, o professor, legitimado pela nomenclatura da sua profissão, do outro Carol, a aluna, representante de um corpo estudantil também regimentado, mas mais indefinido enquanto multidão com os seus códigos variáveis.
John e Carol habitam um mesmo espaço e um mesmo tempo. Mas, será forçoso entenderem-se? Não obstante a partilha de um lugar e de um tempo comum são, como todos nós, seres individualizados na sua consciência e na sua memória. É, por isso, improvável que estabeleçam um processo de comunicação. Na relação – possível - que mantêm, observamos, mais do que factos ou acontecimentos, dois seres que lutam pelas palavras. O discurso torna-se, assim, performativo e só nele se revela a acção. Este minimalismo de Mamet, que encontramos em Beckett ou Pinter, faz de Oleanna uma verdadeira Tragédia sobre o Poder.
Vista de outra maneira, Oleanna pode ser somente uma peça sobre duas pessoas que têm sobre as coisas diferentes pontos de vista. Só que, tal como diz John “Nós só sabemos interpretar o comportamento dos outros através do filtro que nós próprios criamos.” Ou, pelas mesmas palavras “O que é um preconceito? Uma ideia sem fundamento. Todos nós as temos, ninguém está livre disso. Quando uma ideia dessas é ameaçada ou contrariada, sentimos revolta…”
É aqui que começa o conflito. É aqui que começa Oleanna.

Carlos Pimenta, Maio de 2009

* OLEANNA, “Uma tragédia sobre o Poder”

Por altura da sua estreia, em 1992, Oleanna desencadeou “tempestades” e dividiu amigos.

Carol, uma estudante revoltada, vai ter com o seu professor, John, e confessa-lhe a sua incapacidade para perceber o curso que ele ministra. Reagindo à vulnerabilidade da sua aluna, John promete ajudá-la, oferece-se para lhe dar aulas extra, e com as mãos confiantes nos seus ombros tenta acalmá-la e garante-lhe bons resultados.
No 2º acto, Carol, apoiada pelo poder do seu “grupo”, acusa-o de sexismo, elitismo, assédio e violação, duma tal forma que o levará à ruína.

Mas Mamet não está apenas a atacar os excessos do “politicamente correcto”, tão evidentes na América dos anos 90. A sua peça é, na verdade, “um lamento sobre a destruição da confiança mútua e da interacção pessoal que tornam possível a liberdade académica”(1)
Por isso, Mamet, não se cansou de repetir insistentemente que a sua peça está estruturada como “…uma tragédia… sobre o Poder”(2)

De facto, na altura da estreia, em 1992, as preocupações da crítica com a temática do assédio sexual, ou com o “politicamente correcto” ou, ainda, sobre os movimentos feministas, obscureceram o que, na peça de Mamet, é, na verdade, um extraordinário e desafiador “compromisso dramático com as questões do poder, da hierarquia e do controlo da linguagem”(3).
O que está aqui em jogo, verdadeiramente, é o poder e a linguagem que se usa para o manter ou para o eliminar. E se, hoje em dia, conseguimos reconhecer, às vezes, esse “jogo” da linguagem nos meios políticos, já não nos é tão fácil perceber que isso é igualmente verdade em todos os relacionamentos entre os seres humanos. “Toda a gente usa a linguagem em seu próprio proveito, para conseguir o que pretende. (…) Já ninguém fala se não for para conseguir um objectivo.”(4)

Por isso, Mamet tem um fascínio especial pela palavra exacta para descrever um objecto ou uma acção e insiste que a peça está nas palavras. A linguagem é, absolutamente funcional. Sobre Oleanna ele refere que “cada uma das personagens, o homem e a mulher, diz coisas absolutamente verdadeiras em todos os momentos e absolutamente construtivas na maior parte dos momentos da peça e, no entanto, no final estão a cortar o pescoço um ao outro.”(5) Ambos procuram manter ou conseguir poder; ambos estão centrados em si próprios; ambos acabam destruídos.

Quando escreve esta peça, Mamet mostra-se, claramente, preocupado com uma América que está a tornar-se uma sociedade seccionada, construída pelos interesses especiais de certos grupos que ligam ao seu advogado ainda antes de arriscarem a comunicação humana. Nem propagandista nem moralista, Mamet responde a uma América profundamente transformada que aparentemente enlouqueceu.

Mas a terrível verdade é que, em qualquer parte do mundo, mesmo a mais íntima das comunidades, a família, as relações entre homens e mulheres, parecem ter perdido, precisamente, as marcas da intimidade e do relacionamento.


O que o teatro de Mamet faz é mostrar os efeitos devastadores da ausência do sentido de comunidade: a falta de valores genuínos, a falta dum sentido de transcendência, a falta de amor:
“Num mundo moralmente falido podemos ajudar a substituir as acções coercivas e atemorizantes pelo hábito da confiança, e da cooperação. Se somos verdadeiros com os nossos ideais podemos ajudar a formar uma sociedade ideal – não pregando sobre ela, mas criando-a todas as noites em frente do público – mostrando como funciona. Em acção”(6).

Num mundo que, gradualmente, desvalorizou a intuição e as sensações e as substituiu por uma sobrevalorização do conhecimento, tanto na vida pública como na privada, “o teatro tem de empenhar-se em reconhecer e sancionar a universalidade dos nossos desejos e dos nossos medos como seres humanos.”(7)







1- Michael Billington, The Gardian

2- Brenda Murphy, The Cambridge Companion to David Mamet

3- Brenda Murphy, The Cambridge Companion to David Mamet

4- Kane ed., Mamet in Conversation

5- Kane ed., Mamet in Conversation

6- David Mamet, Writing in restaurants



(*a partir de The Cambridge Companion to David Mamet)

Oleanna: apontamentos de um diálogo impossível

Oleanna: apontamentos de um diálogo impossível
A peça Oleanna, do norte-americano David Mamet, datada de 1992, acolhe no acervo das suas preocupações, e de modo refractado e arguto, o malogro da linguagem enquanto comunicação, do esboroamento da retórica enquanto instrumento de negociação da distância entre interlocutores ou da arte da persuasão numa sociedade incessantemente renovada nos seus consensos; e a palavra como poder, aliada a uma lógica que discrimina e exclui no contexto perverso e absurdo em que a liberdade dos sujeitos se permite e activa. A depuração da acção dramática, o desenho vigoroso da situação representada ou a intensidade do conflito – o legado aristotélico é, recorde-se, precioso aliado formal e conceptual da construção do texto - são desde logo favorecidos pela configuração minimalista do espaço, em consonância com a lição do próprio dramaturgo, agora convincentemente iluminada pela opção de Carlos Pimenta. A acção dramática, desdobrada em três actos, confina as duas personagens, John, o docente universitário, e Carol, uma sua discípula, à estreiteza de um lugar, o gabinete do mestre, e esse constrangimento vincula-os ao confronto e ao conflito.
No primeiro acto Carol é insegura e ansiosa, reclama com veemência informação acerca do seu desempenho escolar e apoio urgente em face de dificuldades escolares intransponíveis; o seu interlocutor, concentrado no telefone e atento às expectativas de aquisição imobiliária legitimada pela sua iminente promoção, não leva muito tempo a demarcar o território do saber e a procurar, em leviana confidência, aplacar a vivacidade inconformada da sua aluna. A relação de poder desenha-se com nitidez, mas nos seus interstícios se distinguirá já o olhar felino da figura feminina, agent provocateur que subtilmente devassa o universo pessoal e profissional do seu incauto interlocutor. No segundo acto esta relação de força altera-se: a atitude do mestre é defensiva e a voz de Carol ganha em confiança e eloquência (é ela quem agora dita as regras do discurso), para mais caucionada pela zelosa solidariedade do que ela chama «O meu grupo», assim se hipotecando drasticamente o diálogo e se forçando John ao desesperado gesto físico de lhe procurar barrar a saída. O último acto consuma a inversão das relações de poder: ao arrojo da figura feminina, que construira um libelo acusatório através da reconfiguração e montagem dos seus apontamentos (um motivo condutor da acção dramática, como o é o telefone, espécie de voz córica e aviso insistente) e agora denuncia a hipocrisia do descontentamento contente do seu antagonista e o diletantismo de uma crítica movida ao sistema que alimenta o crítico, responde o professor com a expressão de um patético refrão - «Você não tem sentimentos?» - e com a proposta da secreta adopção de uma transgressora excepção à regra protegida pela confidencialidade e pelo silêncio dos gabinetes; Carol replica ao desastrado recurso último do antagonista com uma alternativa vexatória de censura e discriminação que retirariam a John o sentido e a razão do seu existir; finalmente a provocação mordaz e a insuportável profanação do universo íntimo do professor, que precipitam a sua investida brutal e despertam nele o insulto mais agressivo. Ele fora despojado dos seus sonhos de respeitabilidade e segurança. A vítima, qual animalzinho ferido e encolhido (em posição fetal?) perante a fúria cega do agressor, é afinal a vencedora a quem cabem as últimas palavras - «...sim. É isso mesmo.» - , sussurradas e dirigidas a si própria, lacónicas e misteriosas como fragmentos de um aforismo ou o sortilégio de Oleanna, título colhido nos nomes de Ole e Ana, os infaustos cultivadores de uma terra ingrata que lhes secou as promessas da utopia e as esperanças de uma vida melhor.
Nuno Pinto Ribeiro

Notas soltas

Notas soltas sobre Oleanna*


Oleanna leva-nos, astutamente, a escutar a conversa entre um professor, John, e a sua aluna, Carol. Deste modo, o escritório de John, com o seu potencial de armadilha e a sua vulnerabilidade tanto às intrusões realistas como às efémeras é, simultaneamente familiar e desfamiliarizado, o espaço de um tutório filosófico e a “alegada” cena do crime onde o assédio sexual ocorreu/não ocorreu.

Nem propagandista nem moralista, a resposta de Mamet a uma América profundamente mudada e que aparentemente enlouqueceu é uma peça de noventa minutos reduzida a um espaço, três cenas e duas personagens (três se contarmos com o telefone que interrompe incessantemente). A teatralidade da peça é tão forte e específica que somos imediatamente recordados de que para Mamet “ o poder tem a ver com duas pessoas que querem coisas diferentes”.


Se Oleanna nos enfurece e nos leva a tomar posição, isso é, sobretudo, porque Mamet revela magistralmente o quão pernicioso, subtil e perverso é o controlo do pensamento, o McCartismo dos anos 90. É demasiado simples rejeitar Oleanna como sendo anti – feminista, ou mesmo misógina. Tanto homens como mulheres compreendemos que a obstinada interpretação da verdade de Carol pouco tem a ver com a abolição do elitismo ou do sexismo. Do que estamos aqui a falar é de fascismo mascarado de humanitarismo. “Nesta peça, “ admite Mamet, “o impensável, o inacreditável torna-se real.” Ao perguntar “como é que chegámos aqui?”, Mamet acerta a direito no alvo.



*tradução de excertos de vários textos

Oleanna - Apresentação

O nome Oleanna vem de uma utópica comunidade do séc. XIX fundada pelo violinista norueguês Ole Bull e a sua mulher Anna: daí Oleanna. Esta comunidade norueguesa de agricultores falhou porque a terra que compraram na América era rochosa e muito pouco fértil e todos tiveram de regressar à Noruega.
A relação desse desaire utópico com o sonho falhado da Academia Americana torna-se evidente à medida que a peça de Mamet avança.

David Mamet é um autor neo-realista norte-americano que tem vindo a ser comparado com escritores de nomeada de um Ernest Hemingway, do irlandês Samuel Beckett e do inglês Harold Pinter.

Mais conhecido em Portugal pela sua faceta de argumentista – O Carteiro Toca Sempre Duas Vezes, O Veredicto, Os Intocáveis – foi como dramaturgo que ganhou os Prémios Village Voice Obbie e os Pulitzer de Drama e da Crítica.

Oleanna é uma peça de teatro que se desenrola no gabinete claustrofóbico dum professor universitário, John, sumidade exemplar da máxima racionalidade, que vive num mundo preciso, previsível, regular, estabilizado, mas que é, de súbito, afectado pela presença de uma aluna, Carol, que lhe está nos antípodas, pela sua fragilidade, insegurança, carência emocional e cognitiva, dependente do sucesso escolar, no que ambos se vêem enredados e compelidos para a intrincada trama do dogma, da lei e da teia de normas do sistema de ensino.

Através de Oleanna, David Mamet aponta o dedo a alguns dos mais básicos falhanços da educação americana e aos estragos permanentes que provoca nos jovens; mas, acima de tudo, Mamet usa o sistema educativo como um veículo para a sua temática recorrente, aquilo a que chama “interacções humanas” – que em Oleanna se constitui como um violento exemplo da dificuldade de conciliar “poder” e “compreensão” nas relações humanas.

Oleanna tem sido levada à cena em diversos países e suscitado forte polémica em torno do seu assunto. O diálogo inicial entre o professor que recebe a aluna para analisar um trabalho, transforma-se num violento confronto de ideias sobre as finalidades da educação e o ensino, o lugar do indivíduo na sociedade, as relações entre os sexos e os limites da liberdade – um confronto que envolve o espectador e o incita a tomar posição.